O Médico
Quando
deixo os prédios da universidade minha mente alberga uma carga demasiadamente
extensa de conteúdos. Diversas teorias científicas invadem as minhas noites,
reduzindo drasticamente o tempo de um sono sadio. A tarefa de ser médico, não
se encaixa, neste momento, na definição saudável.
Patologia,
anatomia e condutas clínicas permeiam meus pensamentos. O mundo grita, perfaz
seu espiral, mas continuo olhando para dentro, células, moléculas e
mitocôndrias são o meu deitar e levantar.
No instante em que o jaleco me abraça e o
estetoscópio cerca meu pescoço não posso mais errar. O peso disso reduz a
leveza, eleva a pressão social e profissional. Preciso me esforçar e demonstrar
seriedade.
Eu
me torno objetivamente o doutor do outro. Preciso cuidar e fazer tudo com excelência.
Debruçar-me nos atlas e computadores sem tempo para imaginar subjetivamente,
sem pausa para sentir meu próprio corpo e, talvez, sem a oportunidade de ver
quem acamado está com outro olhar.
O Palhaço
Em
minha face brilha a pintura autêntica que modula uma identidade distinta das
outras. Por detrás de um nariz que não tem parte óssea e tampouco
cartilaginosa, há uma alma viva e disposta a conceder vida a quem por perto estiver.
O nariz vermelho remete-nos ao sangue que percorre os nossos corpos e o estado
vívido de nossos corações recheados de sentimentos.
Flores
preechem os bolsos de um jaleco costurado à subjetividade e ocupam o lugar dos
medicamentos traiçoeiro e tristes. Faço dos corredores hospitalares trajetos
ricos de poesia.
Abstenho-me
do entendimento das células neoplásicas para enfiar nos quartos a magia e o
valor da besteirologia. A cura agora é testificada com sorrisos. Fazemos nascer
do ridículo a possibilidade de esquecer as grosseiras seringas, desgostosos
prontuários e desfibriladores de cara amarrada.
Tudo
muda de cor quando se tenta entender a dificuldade e sofrimento alheios. Talvez
pintar a cara nos faça ver o mundo com novos olhos. Ver pela janela do hospital
um pouco da vida que pulsa lá fora, pulsando aqui dentro.
Um
simples nariz vermelho me fazendo enxergar quem
sou e a entender o quão importante é pronunciar, VIDA!
Poesia de Lucas Teles, concedida aos graduandos do curso médico da instituição de ensino UNIFENAS, para o documentário " Amor e Alegria na Formação Médica".