Via Semente - MENINAS
14:31
Um ano inteiro
se passou e eu não deixei de carregar o peso deste silêncio. Todos os dias, ao
voltar da faculdade, o mesmo ponto de ônibus e ela ali, pertinho, com suas
pastas enormes e seu peculiar estilo de estudante de Artes Visuais. Num
cotidiano exaustivo, eu diria que o meu instante de paz era neste lugar, o
ponto, durante sete minutos contados no relógio, antes de ela partir. Mas os
nossos olhares sempre se batiam. Incrível!
Confesso que
planejei algumas palavras. Cheguei a comprar um bombom bem grande e delicioso,
também fiz um laço vermelho, algo meio artesanal, e junto, uma pequena
mensagem. Mas me faltou coragem. Eu entrei em conflitos tentando calcular o
motivo pelo qual eu só recebia olhares. Ela não poderia se manifestar? Ela já
tentou algo?
Dias de
estresse, tristeza, vitórias, alegria, e, mesmo divididas pelo silêncio,
compartilhávamos a VIDA por meio de nossos verdadeiros olhares.Sempre, naquele
ponto de ônibus, às 22:07. Eu chegava com uma avenida agitada, a via, a
reparava, e só entrava no ônibus quando tudo silenciava, inclusive os nossos
olhares.
Foi num dia
chuvoso que cheguei ao ponto e me surpreendi. Todos os rostos comuns não
estavam presentes e somente ela, ali, fantasticamente a esperar o ônibus. Eu,
muito molhada, não sabia se olhava ou se me secava. Ela segurava timidamente
seu guarda-chuva. Um sorriso escapou dos nossos lábios e pude ouvir um “Tum, Tum,
Tum” mais acelerado dos nossos corações. Ali começava um diálogo.
Mas a chuva
bruscamente aumentou e ela entrou em seu ônibus. Eu precisei me enfiar por
debaixo da cobertura do ponto afim de evitar que todos os meus trabalhos finais
molhassem. Vislumbrei um pequeno guarda-chuva bem no meio do banco. Entranhado
em seu material negro, um pequeno bilhete dizendo:
“Lívia, Artes
Visuais. Boa chuva para você!”
Pulei e não pude
conter minha euforia. Desisti do ônibus e fui vagar pelas ruas molhadas usando
aquele lindo guarda-chuva.
Lucas Teles, às 13:44 do dia 20 de novembro
de 2012.
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